TRANQUEIRA* INVICTA

Lá se vão duzentos e cinqüenta anos desde que um grupo de luso-brasileiros fixou-se em elevada barranca na confluência dos rios Jacuí e Pardo. Ponto estratégico, visava não só marcar o domínio português nessa região da América do Sul: serviria também de base para a demarcação de limites promovida por representantes de ambas as coroas ibéricas em decorrência do Tratado de Madri (1750), através do qual fora acertada a troca da Colônia do Sacramento, bastião português às margens do Rio da Prata, pelos Sete Povos das Missões, de domínio hispânico.

Estava lançada a semente do povoado que, pouco depois, nos arredores daquele avançado posto lusitano, passaria a formar-se, principalmente com a chegada dos colonos açorianos (1752).

No entanto, questões diplomáticas e a resistência dos guaranis e dos jesuítas em entregar os aldeamentos fincados na banda oriental do Rio Uruguai acabou adiando a concretização do referido Tratado. Assim, a fortaleza ali construída, já em 1754, foi alvo de ataques por parte dos índios missioneiros. Anos mais tarde, foi a vez dos exércitos castelhanos - auxiliados pelos mesmos nativos - postarem-se à frente das frágeis paliçadas e exigirem o retorno dos luso-brasileiros para os limites do Tratado de Tordesilhas (1494), ou seja, a Vila de Laguna. Não fossem as estratégias adotadas pelos bravos que ali se aquartelavam - o lendário Regimento de Dragões - a cidadela teria caído em poder dos inimigos, já que a desproporcionalidade numérica dos primeiros favorecia, em muito, os espanhóis. Não por outro motivo escreveu Souza Doca:

“Nos fluxos e refluxos de nossas fronteiras, pelos nossos embates com os filhos de Castela, estes jamais conseguiram transpor as barreiras do Jacuí, em cujas margens se alteava, como em desafio, a tranqueira, do Rio Pardo - reduto invencível das armas brasileiras”.

As escaramuças então ocorridas – além das protagonizadas por farrapos e imperiais décadas mais tarde – ficaram registradas naquela terra, que algum sangue bebeu de tantos combatentes.

Evocando o passado de lutas da velha tranqueira, Rogério do Amaral Ribeiro brinda-nos, agora, com imagens da cidade do Rio Pardo, vista através de um “véu rubro”, ou, para melhor adequar-se à linguagem técnica, de um filtro vermelho. Acompanhadas dos poemas de Gláucia de Souza, as fotografias mostram desde os testemunhos arquitetônicos de uma época de glória até os flagrantes do quotidiano de sua gente.

Com certeza, a parceria foto&poesia levará o visitante a passear por uma das mais belas páginas da história rio-grandense.

texto de Júlio Bacchin

* No dicionário Aurélio: Tranqueira. S.f. (1) estacada para cercar ou fortificar, tranquia (2) trincheira. [...]

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